Contratação de seguros no exterior: o que nossa legislação diz e uma posição a respeito

Ao longo dos últimos anos, o mercado segurador brasileiro conseguiu ampliar seu leque de oferta de produtos securitários. Como sabemos, isso ocorreu em especial após o fim da hiperinflação, que assolava o mercado com o corrompimento do poder de compra dos valores indenizatórios, e a abertura do mercado de resseguros, que aumentou a capacidade de subscrição de riscos das seguradoras.

No entanto, mesmo com tal cenário, uma entidade estabelecida no Brasil pode optar pela contratação de seguros no exterior, desde que dentro de situações específicas estabelecidas em lei. O Art. 20 da Lei Complementar 126, sancionada em 2007, é esclarecedor:

A contratação de seguros no exterior por pessoas naturais residentes no País ou por pessoas jurídicas domiciliadas no território nacional é restrita às seguintes situações:

I – cobertura de riscos para os quais não exista oferta de seguro no País, desde que sua contratação não represente infração à legislação vigente;

II – cobertura de riscos no exterior em que o segurado seja pessoa natural residente no País, para o qual a vigência do seguro contratado se restrinja, exclusivamente, ao período em que o segurado se encontrar no exterior;

III – seguros que sejam objeto de acordos internacionais referendados pelo Congresso Nacional; e

IV – seguros que, pela legislação em vigor, na data de publicação desta Lei Complementar, tiverem sido contratados no exterior.

Parágrafo único. Pessoas jurídicas poderão contratar seguro no exterior para cobertura de riscos no exterior, informando essa contratação ao órgão fiscalizador de seguros brasileiro no prazo e nas condições determinadas pelo órgão regulador de seguros brasileiro.”

A legislação não prevê a necessidade de autorização prévia para o ato da contratação, mas caso o cenário seja de contratação por parte de pessoa jurídica para riscos localizados no exterior, o estipulante, em até 60 dias após o início da vigência da apólice, deverá realizar a comunicação da efetivação do contrato à SUSEP através de preenchimento e envio de formulário específico (conforme o Anexo III da Circular SUSEP nº 392/2009).

É importante ressaltar que em caso de controvérsias com o seguro contratado legalmente no exterior, o órgão a ser acionado é aquele que detém poder regulatório no mercado segurador do país escolhido. A SUSEP, por ser uma autarquia com atribuições limitadas à jurisdição brasileira, não tem alçada para participar de eventos litigiosos ocorridos fora do país.

O que penso sobre o atual panorama protecionista

Art. 19.  Serão exclusivamente celebrados no País, ressalvado o disposto no art. 20 desta Lei Complementar:

I – os seguros obrigatórios; e

II – os seguros não obrigatórios contratados por pessoas naturais residentes no País ou por pessoas jurídicas domiciliadas no território nacional, independentemente da forma jurídica, para garantia de riscos no País.

Em um cenário de mercados cada vez mais globais, julgo que seja um ponto negativo a existência de leis que determinam a contratação de seguros exclusivamente no país e impõem severos limites para a firmação de contratos no exterior.

Uma entidade brasileira, em termos de administração de seu patrimônio financeiro, é livre para tomar decisões a respeito da alocação de seus recursos. Ela pode imobilizar seus ativos no país e utilizar os serviços aqui presentes ou fazê-lo em um sistema financeiro de outra jurisdição (offshore), desde que observada a legislação local e as políticas de PLD/CFT e feitas as declarações previstas em lei à Receita Federal do Brasil.

No âmbito do mercado financeiro, não há qualquer impedimento para utilização de serviços bancários e realização de investimentos no exterior de forma legítima (apesar da existência de uma extensa burocracia nesse processo), existindo apenas as corretas exigências legais de declaração desses ativos ao fisco.

Já no mercado segurador, o acesso do estipulante brasileiro à opções fora do país é extremamente limitado, como se vê nas citações expostas acima.

Há quem defenda a tese de que o fim da restrição causaria uma generosa fuga de riscos do mercado segurador brasileiro, pois os seus respectivos estipulantes encontrariam melhores soluções securitárias no exterior, o que poderia enfraquecer as bases do mercado.

Na condição de crítico de qualquer teoria protecionista na esfera mercadológica, eu creio que o mercado segurador brasileiro deve, através de seus próprios méritos, ter competência para atrair e reter riscos para si (e certamente é capaz disso), ao invés de usufruir de uma blindagem imposta por lei, que acaba por tolher o fator concorrência e prejudica, em última instância, o consumidor final de seguros.

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